Perco-me nos caminhos e encontro-me nas encruzilhadas...abandono-me nas palavras e encontro-me nos pontos finais...dispo-me nos meus poemas para me encontrar nas entrelinhas...escrevo-me e fico sempre no outro lado de mim...tão perto e tão longe de ti...como o mar que afaga os meus olhos...e a tempestade que leva o meu corpo para o infinito onde te espero...para o vazio onde não te tenho...no labirinto onde não me encontro.
Sou um espaço em branco...um abraço frio do tempo...o resto que ficou esquecido entre as paredes nuas dos sonhos...esperando em silêncio pelo toque de uma mão...pelo anseio do desejo...pelo beijo que ficou entre a boca e o gesto...pelo colo ausente no vazio presente...rasgando a solidão de todas as noites...caminhando pelo escuro de todas as ruas...na estrada sem fim que prende os meus passos...nas rochas que me magoam o corpo...na solidão que me veste...no muro que me rouba a luz...no ocaso do meu olhar esculpido numa lágrima...gritando um lamento eterno e vão...sem resposta e sem mim...anoitecendo e amanhecendo...e eu vazia...e o tempo correndo e a vida esgotando-se...e eu sem nada e o meu corpo sem ti...e os meus dedos sem pele...e as minhas mãos tateando o vácuo...e os meus braços acorrentados...e os meus olhos chovendo lágrimas e o mar levando o meu lamento para tão longe da vida...para tão perto do nada.
É no escuro da minha alma...que os meus poemas dedilham um triste fado...que desagua no meu peito a tempestade de que sou feita...que me escrevo no silêncio de todos os gritos...que me dispo de mim para me vestir de ti...que me doiem os Dezembros do meu leito...os espinhos das minhas lembranças...os pesadelos onde repousam os meus fantasmas...os limbos onde a noite é mais noite...na mágoa que escorre do meu sono... pesadelo do meu sonho...no aconchego gelado do meu adormecer...na fria claridade do amanhecer.
Doi-me o silêncio...doiem-me as palavras...doi-me o tempo...doi-me a vida...doi-me a solidão.